15 agosto 2014

Nova época

Preocupei me pouco com a saída de Matic. Principalmente porque o sérvio era já em si o rosto da adaptabilidade e transformação. O rosto do "se não for ele, há de aparecer outro". O Manel como foi instituído na época passada. Goste-se muito ou pouco do estilo de Jesus é inegável a sua capacidade de trabalhar jogadores e regenerar equipas. Aliás, é nessas situações limite em que se vê mais "Jesus".

Recordar o verão de 2012 é confirmar esta ideia. Quando tudo parece fácil é mais difícil focar no que eram Enzo e Matic por esses meses e no pânico que se instalou após a venda repentina e sob o apito final do miolo da equipa. Objectivamente a bola resume-se a resultados desportivos, e as opções da direcção são validadas pelos golos e vitórias, mesmo quando seja complicado identificar uma estratégia racional para condução do clube.

Jesus tem sido a peça chave neste processo, conseguindo curiosamente ser ele próprio o criador dos argumentos da sua crítica. Com o passar do tempo tudo parece fácil com Enzo; com Coentrão até qualquer um; como é que não se ganha com um jogador como o Matic; e a sorte que ele teve quando a direcção lhe deu Javi.

Mais uma vez a direcção põe o treinador à prova, esticando a corda com uma sangria de proporções épicas, a tender para o catastrófico. O argumento BES é válido, mas questionáveis são as opções que nos encaminharam até esta dependência capaz de ruir o trabalho feito estes últimos anos. Fica claro no entanto que do ponto de vista do investidor apresentamos segurança e credibilidade, tendo em poucos meses demonstrado capacidade em gerar dezenas (centenas?) de milhões de euros com os activos desportivos actuais. Paradoxalmente, fica igualmente claro, que nem tudo é muito claro, sendo a venda de Garay uma das negociações mais ridículas dos últimos anos, por muito que o presidente tente pintar o cenário. O pacote formação é outra situação dúbia, tanto pelas opções de empréstimo, como pela contradição entre discurso da direcção e os seus actos. Não é possível seguir este rumo conscientemente e ao mesmo tempo afirmar que mais cedo ou mais tarde a equipa técnica terá ter outro modus operandi. Principalmente quando esta capacidade regeneradora tem sido o principal factor na validação e sustentação das opções mais ou menos acertadas da direcção.  

Mais do que a sequência de jogos sem vitórias na pré-epoca, preocupante são estas contradições de discurso dentro da estrutura resultando numa sucessão de recados entre presidente e treinador. Se por um lado podemos acusar a direcção de um desfalque irresponsável no plantel - e não nos iludamos, não entrará ninguém de peso, se não não andaríamos a vender - por outro não nos podemos deixar levar pelas lamurias de Jesus. Mesmo com maior dificuldade, a exigência mantém-se, e dentro do plantel existe ainda um grupo que transitou da época passada, com processos assimilados e capacidade para fundar uma equipa sólida, com uma postura competitiva de imediato nestas primeiras jornadas.

Independentemente do desnorte estratégico na gestão do plantel, a manutenção da equipa técnica e dos seus processos é ainda um trunfo bastante desconsiderado pela comunicação social. Fica no entanto claro que este ano não há glória para Vieira. Se no ano passado foi quem deu a cara pela manutenção do treinador, este ano o fracasso será todo seu. A glória, inevitavelmente será de Jesus.